segunda-feira, 6 de setembro de 2010


Era sexta-feira. Aconteceu algo inusitado: uma garota da minha classe me chamou para sair com os amigos dela, meio intimidada eu aceitei, mas não levei aquilo muito a sério, afinal, nós não conversávamos direito. Ela disse para eu estar na casa dela as 19:00 horas, mas a minha vontade de ficar em casa olhando o teto era tão atentadora que eu desisti e ensaiei alguma desculpa esfarrapada para dar a ela na segunda. Eram 20:30 e eu havia acabado de sair do banho quando a campainha tocou. Troquei-me rapidamente e sai na varanda e adivinhem? Era ela e seus dez amigos, - muito bonitos, por sinal – então, eu desci com a cabeça baixa, pois não sabia aonde enfiar a minha cara de tanta vergonha por ter “dado o cano’’ nela. Ela foi muito compreensiva e me convenceu a ir ao Stones. Sempre fui uma grande fã do Stones (as casas de todas as casas) e sempre que meu dinheiro permitia, eu passava por lá. Era um ótimo lugar para conhecer pessoas interessantes, isso se você não se importar de que 95% das mulheres são lésbicas e as outras 5% são de mulheres que não fazem idéia de que lugar é o Stones. Alguma coisa me dizia que a noite iria ser boa. Então, subi ao meu apartamento, peguei minhas chaves, celular, dinheiro e desci. Fomos a pé. De primeira, eu me simpatizei muito com um cara e passamos o caminho inteiro conversando, até que resolveram parar em uma praça próxima ao Stones para fumar maconha. Antigamente, maconha era sempre bem-vinda, não importava a ocasião. Acho que o pior problema da maconha é que ela me deixa meio lerda, o que é péssimo para uma sexta-feira a noite numa cidade como essa. Então, fiquei apenas com os meus cigarros, acompanhada do mesmo cara. Na segunda parada, fomos a um lugar chamado “Skina’” para comermos um pouco, depois sem mais problemas chegamos ao Stones. Antes de entrar, eu bebi na porta um copo cheio de uma tal de 61 que quase me fez vomitar. Depois com mais uma dose de alguma coisa eu estava pronta para entrar. O grande problema daquele lugar é que a única coisa que importa é o seu dinheiro e sua aparência. O que era uma desleal concorrência para mim. Quanto maior o seu salto for, melhor. Só que o meu all star já estava rasgado nas bordas. Entramos e procuramos uma mesa para sentar, ficamos uma boa parte do tempo apenas sentados conversando, até que eu resolvi dar uma circulada pelo local. Mal me levantei e um cara me puxou pelo braço e começou com as típicas cantadas que nunca dão certo, mas pelo menos, não foi como de costume: um desconhecido chega, te puxa para um beijo e quando eu menos espero ele desaparece, tudo assim, sem sentido algum e sem trocar palavras. Então, resolvi aceitar o convite dele de me pagar uma bebida. Só que, ele entrou em uma conversa perguntando onde eu morava, com quem eu estava e se ofereceu para me levar embora. Mas, obviamente ele estava à procura de sexo. Ele me disse que morava em Moema. Do mesmo jeito que dois mais dois não são cinco, aquele cara não morava em Moema. Então, eu disse qualquer coisa e dei um jeito de sair de perto dele. Não que isso faria alguma diferença para um cara maior de idade, eu era apenas “mais uma”. E eu não queria ser apenas mais uma, ainda resta razão em minha cabeça. Voltei para a mesa e começamos a beber e falar merda. Enquanto isso eu pensava “Quem diria que minha colega de classe iria me apresentar pessoas tão interessantes?”. Eles realmente eram. Depois de um tempo, o cara que eu mais tinha me simpatizado me chamou para ir lá fora para fumar uns cigarros e eu fui. Estava encostada em uma madeira e então olhei para o lado e vi o homem dos meus sonhos: cabelos pretos ondulados, olhos castanhos escuros, mais ou menos 1,75 cm, branco feito leite e algumas pintinhas espalhadas pelo pescoço. Eu não consegui tirar os meus olhos dele, estava descaradamente admirando-o. Meu companheiro percebeu, lógico. E disse que conhecia a garota que estava com ele, disse que era prima dele, mas não tive coragem de falar-lhe para ir até lá e me levar junto, até porque eu ficaria morrendo de vergonha, não manteria o contato visual nem por dois segundos. Terminei o meu cigarro e quando eu estava entrando, o vi indo em minha direção, provavelmente todos ali perto ouviram o meu coração bater. Ele veio:
- Olá.
Dei um sorriso extremamente tímido e fiquei calada. E ele insistiu:
- Qual seu nome?
Timidez.
- Amanda. E o seu?
- Hm, Amanda... Meu nome é Gustavo. Quantos anos você tem?
- Quinze...
- Sério? Haha.
- Sim. E você?
- Tenho 21. Você é tão nova, mas não aparenta.
Nesse meio tempo, o cara que estava comigo, voltou para a mesa.
- É, idade é algo relativo.
- Concordo. Então, quantos anos você acha que tem, mentalmente?
- Bom, isso eu não posso lhe responder, porque também é relativo. Tem horas em que eu me sinto até que madura, mas em outras... Eu pareço um bebe.
- Por quê?
- Porque depende da pessoa e do assunto em questão.
- Então, eu irei acender um cigarro e se você aceitar, a gente pode conversar e assim eu terei minha conclusão sobre você e pararei de fazer perguntar chatas, hahaha.
- Hahaha, tudo bem.
Depois daí, descobri que ele morava no Rio de Janeiro, o que não foi grande novidade, o sotaque dele era notável. Tivemos divagações sobre relacionamentos, religião, gostos musicais, – ele tem um ótimo gosto musical, só para constar – sobre destino, sobre cidades do interior, sobre empregos, sobre faculdades e até sobre arquitetura. Uma verdadeira chatice. Ou melhor, um assunto muito pesado para uma sexta-feira à noite:
- O céu está meio claro, né? Que horas são?
- Amanda, já é quase cinco da manhã!
- O que? Não pode ser!
Olhei no meu celular.
- Caramba! Era uma e meia quando começamos a conversar. Parece que estamos aqui há meia hora. Onde enfiamos as horas restantes?
- Hahaha, não me pergunte. E preciso dizer que eu me surpreendi. Você é muito interessante. Você tem como ir embora?
- Se meus amigos não me abandonaram, o que é bem improvável, eu tenho. Mas, eu moro bem perto daqui, então não tem problema. Então, acho que já vou indo...
- Eu lhe acompanho, é o mínimo que posso fazer.
- Haha, obrigada.
Até hoje acho que entramos em algum tipo de portal naquela noite, as horas perdidas não faziam sentido e nunca mais voltaram, igual a todas as outras horas perdidas, mas nesse caso foi diferente.
- Isso é verdade. Tudo é tão efêmero, que justamente por isso, esse tempo que passamos juntos é importante.
- Eu sei. Essa é a nossa situação. É provável que a gente nunca mais se veja depois disso, não?
- Você acha mesmo?
- O que você acha?
- Sei lá. Eu não tinha planejado outra viajem.
- É... Eu moro em São Paulo e você no Rio. Vamos tentar outras coisa. Se hoje for nossa unica noite não é tão ruim. As pessoas acabam perdendo o entusiasmo com o passar do tempo.
- Eu detesto isso. Mas, por que os relacionamentos têm de durar pra sempre?
- É, isso é idiotice...
- Então é isso? Está é a nossa única noite?
- Não temos escolha.
- Tudo bem. Será assim. Sem ilusões, sem projeções.
Paramos em um parque próximo a minha casa e ficamos deitados na grama admirando o sol forte, mas que não conseguia nos aquecer.
- Já vivi muitos momentos lindos com outros caras, como viajar ou ver o sol nascer. E eu sabia que eram momentos especiais. Mas sempre havia um problema: eu queria estar com outra pessoa. Eu sabia que o cara não entendia exatamente o que eu sentia. Mas, com você... Estou feliz. Não imagina o quanto uma noite como essa é importante para mim. Mas é.
- Será que vamos ter outras madrugadas como esta?
- E enquanto a nossa decisão racional e adulta?
- É... Mas, sei como é não desejar uma pessoa. No geral, eu não gostaria de estar comigo mesmo. Pense nisso: eu nunca estive num lugar onde eu não estivesse. Nunca beijei alguém sem que eu estivesse dando um beijo. Nunca fui ao cinema sem estar lá, fazendo alguma piada idiota. É por isso que tanta gente se odeia. Elas estão de saco cheio de estarem com elas mesmas. Suponhamos que ficássemos juntos e você começasse a sentir raiva do meu jeito. Já ouvi as minhas histórias, por isso estou cheio de mim mesmo. Mas, ao mesmo seu lado, eu me senti outro. E a única outra forma de me soltar assim é bebendo ou com alguma droga, coisas assim.

Após isso, pude sentir casa centímetro do meu corpo estremecer. Minha alma estava perdida no tempo e descobri que foi assim desde o momento em que o vi. Depois de um tempo, saímos de lá e chegamos à minha casa. Após longos abraços apertados e olhos lacrimejando:
- Diga adeus.
- Adeus.
- Até logo.
- Au revoir. 
Dizem que a alma nunca morre. Por que eu senti a minha indo?

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